quarta-feira, 27 de novembro de 2002

CRÍTICA: K19 WIDOWMAKER / Quero que os submarinos afundem

Os jornais dão que "Cidade de Deus" estreou em 99 salas em todo o país. Menos aqui no Sul, o que me leva a pensar: o movimento separatista finalmente foi bem-sucedido. "Cidade", um dos filmes mais esperados do ano, tá passando até no Canadá! Por aqui, em compensação, chegou um outro nacional, "A Paixão de Jacobina", que pretendo ver, lógico, mas só na próxima reencarnação. Após agüentar o trailer umas dez vezes, estou tendo pesadelos com a cara de mártir da ex-paquita. Logo, a saída foi prestigiar uma produção aí em que o Harrison Ford imita sotaque russo dentro de um submarino nuclear. Isso, falo de "K-19: Widowmaker".

Opa! O que estou fazendo assistindo a uma aventura que se passa num submarino? Já vi o filme definitivo do gênero, o alemão "O Barco – Inferno no Mar". E não é que rodaram recentemente um tal de "U-571"? O que Hollywood pretende, filmar o alfabeto inteiro? A vantagem de ser um filme subaquático é que só dá homem. Ou seja, as perspectivas são boas. A única mulher da empreitada é a diretora, e não sei se ela conta, já que é ex do James Cameron. Mas, pô, trama com submarino nuclear geralmente é chata. Submarino nuclear no ártico durante a guerra fria, então, tende a ser pior. Se confinassem no submarinovich mais três personagens-padrão que cansam a minha beleza (monarcas, vampiros, presidentes americanos), eu não iria ver "K-19" nem que a vaca russa tussa.

O "Widowmaker" do título refere-se ao sub soviético construído em 1961. Como ele não está pronto, mas os militares insistem que ele parta imediatamente, o comandante Liam Neeson é substituído pelo Harrison Ford, ambos russos com um inglês impecável. Obviamente, os dois nutrirão ódio mútuo um pelo outro, mas se transformarão em melhores amigos até o final. Ocorre um vazamento nuclear no sub, e vários homens têm que se aproximar da radiação para tentar soldar o cano. Entrar num recinto radiativo sem proteção adequada deve ser ruim e pode causar problemas de pele, mas não parece ser assim tão terrível – afinal, toda vez que tem um militar junto ao reator, o local toca uma música-ambiente de ópera. E "Widowmaker" significa "fazedor de viúvas", que é um termo sombrio, feio. Recomendo acrescentar uma letrinha e passar pra Windowmaker, fazedor de janelas. Um submarino com janelas, cortinas, vasinhos de flores nos parapeitos, certamente mudaria o humor da tripulação. E, já que estamos no quesito "decoração interior", que tal jogar fora essas ogivas nucleares? Elas não combinam com o tapete da sala de controle.

O cartaz do filme traz o Harrison sério e bravo, aparentando apenas 59 dos seus 60 anos, e o slogan "O destino encontrou seu herói". Não entendi. Ué, se você junta um veículo bélico a armas potentes, algo sempre vai dar errado. Isso não transforma ninguém em herói. Herói, pra mim, é quem prega a desobediência civil em tempos de guerra. Herói é não entrar num submarino nuclear. Por esse prisma, eu, por exemplo, sou uma heroína. Fico bem longe desses brinquedos de adultos. Vejamos uma criança que brinca com fogo: ela se queima, mas consegue se safar. Ela é uma heroína? Que diacho ela tava fazendo com fogo, em primeiro lugar?!

"K-19" tem um ritmo legal, até chegar ao final. Os últimos trinta minutos são um porre. Só tem discurso de "capitão oh meu capitão" e de como eles cumpriram com o dever. Parece horário eleitoral gratuito. Tanto que um carinha no fundo do cinema dormiu. Aliás, foi um pouco mais além. Acho que ele entrou em coma profundo mesmo. Os amigos se levantaram, cruzaram por ele, postaram-se na frente, tiraram fotos, riram às pampas. E o sujeito não dava sinal de vida. Só acordou muuuito depois.

Bom, então ficamos assim. Como regra geral, mantenha distância de filmes que contenham números no título. Mistura de números e letras, tipo placa de carro, é um antecedente perigoso. Lembre-se de "K9, Um Policial Bom pra Cachorro". E só embarque num submarino se ele for amarelo e tiver quatro ingleses cabeludos cantando lá dentro.

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